Uma palavra em nome da Associação das Artesãs de São José de Ribamar:
Meu nome é Sâmia Matos, sou artesã ceramista e presidente da Associação dos Artesãos de São José de Ribamar, tenho 40 anos, moro no município Balneário de São José de Ribamar, que é o principal destino da fé no Estado do Maranhão. A igreja da cidade homenageia o santo protetor dos pescadores: o São José, que é um santo de grande devoção do povo maranhense, e que nos inspirou para mostrar ao mundo a nossa arte e a usar as mãos abençoadas para transformar com criatividade o barro em geração de renda.
Nossa atividade começou quando participamos de um treinamento em 2000, através do SEBRAE, e que despertou nos participantes uma visão de oportunidade de renda através da comercialização de produtos de cerâmica. Neste primeiro momento só aprendemos a fazer imãs de geladeiras e pequenas peças feitas a partir de moldes de gesso, o que limitava a nossa criatividade e restringia a diversidade dos produtos.
Mesmo assim, acreditamos que trabalhando de forma coletiva, poderíamos evoluir na produção de cerâmica, e por isso reunimos um grupo de artesãos e fundamos a Associação dos Artesãos de São José de Ribamar, em 04 de abril de 2000, tendo o objetivo de contribuir para o crescimento e desenvolvimento das explorações artesanais, para melhorar as condições de vida de seus associados e trabalhar em benefícios das pessoas carentes. Assim, iniciava-se nosso caminho pela arte.
A maior dificuldade desde o começo era a linha de produtos adotada pela Associação, não tinha diferenciação e nem foco no mercado, pois era comum e não refletia a cultura local (confecção de pato Donald, vasos e imãs de geladeira). Aos olhos dos consumidores os produtos não agregavam nada, e uma vez que estes não conseguiam ser demandados, vivíamos desmotivadas, sem reconhecimento e sem remuneração.
A dificuldade de obter a remuneração, a utilização de técnicas de produção ultrapassadas e a confecção de peças artesanais sem alma deixaram marcas na Associação, pois dos 33 associados inicialmente, somente 15 artesãs continuavam a acreditar na arte. Parecia que o pesadelo não queria dissipar. A mudança não se apresentava e os artesãos passaram a exercer outras atividades paralelas, a arte já não era alma e sim fragmento deixado ao lado ou esquecida.
Eu não poderia deixar que a nossa história acabasse assim, já estava incomodada com a situação inerte que se estabelecia, mas continuava acreditando no meu sonho e de minhas companheiras, por isso tomei iniciativa e busquei orientação em instituições que apoiavam o setor de Artesanato. Todas e quaisquer informações sobre formas e alternativas viáveis que pudessem melhorar o processo de produção existente, formas de gestão para os pequenos empreendimentos artesanais, e estratégias para comercialização dos produtos.
Fiquei atenta a todos os detalhes orientados e para iniciar a mudança, realizamos um diagnóstico participativo para identificar os gargalos do processo que estava sendo utilizado por nós.
Assim, o diagnóstico foi realizado de forma coletiva com os artesãos e constatou-se que a técnica de produção utilizada estava ultrapassada, pois o trabalho com formas não despertava nos clientes/mercado o interesse pelo produto. Além disso, a linha de produtos não era diferenciada e apresentava-se sem foco. Não conhecíamos nossos custos de produção, não sabíamos formar os preços de vendas dos produtos; e a nossa produtividade era muito baixa e desorganizada. Eu não conseguia mais aceitar o comum, tínhamos que encontrar o movimento e a beleza para nossas peças, e aprender a gerenciar o nosso pequeno negócio de forma empreendedora.
E foi com esta vontade de diferenciar a nossa produção que começamos a investir em cursos de melhoria do processo de produção, criação e gestão, eu sabia que se persistíssemos iríamos encontrar o nosso foco de mercado e nossa técnica iria melhorar, este foi o nosso primeiro passo, de mais longe já viemos.
Desistir nunca, persistir sempre, e com essa vontade e muito comprometimento de todo grupo, as mudanças ocorreram. A Associação dos Artesãos de São José de Ribamar insistiu, acreditou e começou a agir. A primeira ação tomada foi trocar de fornecedor da argila, pois em testes tecnológicos realizados pelo CEFET/MA (Centro Tecnológico do Maranhão), a matéria-prima utilizada por nós era de baixa qualidade. Mas, a mudança maior ainda estava por chegar à superfície. A mestra-artesã, Maria Isabel Mendes Matos, chegando ao grupo através do SEBRAE/MA, nos orientou no processo fundamental que é o preparo e tratamento da argila, depois nos propôs a mudança da técnica utilizada para confeccionar os produtos artesanais, associado a inserção da Cultura Local na criação das nossa peças. Deixar as formas engessadas e trabalhar com a modelagem – utilizar a mão-livre. Agora era das nossas mãos que surgia a arte. E foi acreditando neste novo caminho que nós enfrentamos o desafio de aprender a modelar as peças artesanais. Os novos caminhos começaram a ser percorridos.
Novamente, ganhamos coragem e cada dia nos contagiávamos com novos produtos que antes nem imaginávamos que tínhamos capacidade de fazer e o melhor apenas utilizando nossas mãos.
A nossa vontade de vencer foi maior que os obstáculos e passamos a acreditar que desta vez encontraríamos a luz no fim do túnel. Passei a me dedicar exclusivamente àquela atividade, não existia mais dia ou noite, construíamos e desconstruímos peças. Nossa casa agora era a Associação.
Por outro lado, passei a me dedicar também à gestão do grupo em todos os sentidos: organizando a produção, dividindo tarefas e responsabilidades, definindo metas de produção desafiadoras para melhorar nossa produtividade, e principalmente na área financeira. Tive que me esforçar muito, fazer muitos cursos e aproveitar e aplicar ao máximo tudo que aprendia, passei a fazer controles das nossas despesas, das vendas e do nosso lucro, e principalmente aprendi a calcular o nosso custo de produção e a formar os preços de nossas peças, e com isso passei a ter mais segurança para negociar com os clientes e lojistas, e no final saber calcular a remuneração de cada artesão de uma forma justa e sustentável.
Hoje, permanecem 10 artesãs trabalhando, criando e reinventando o artesanato em cerâmica, inspiradas na religiosidade e no cotidiano dos trabalhadores, retratando em suas esculturas a religião, a economia e a cultura popular de São José de Ribamar, uma arte diferenciada que revela personalidade própria.
Nossos produtos ganharam mercado, o nosso artesanato hoje é reconhecido. Antes não tínhamos remuneração, lembro como se fosse hoje, pois antes não tínhamos perspectivas nenhuma. Hoje já conseguimos comprar nossas coisas com o nosso próprio dinheiro, fruto da nossa arte.
Como resultado do nosso trabalho, nós compramos uma sede definitiva para a Associação, onde além dos espaços de produção temos nossa própria loja. Conseguimos modernizar nossos equipamentos, realizamos várias Mostras e Exposições com parceiros, realizamos também Oficinas para jovens da comunidade, adquirimos nosso computador e ampliamos nossa produção.
Nossa rede de parceiros aumentou na mesma proporção que nós passamos a acreditar em nosso trabalho, entre eles o SEBRAE/MA, a Prefeitura de São José de Ribamar, o Ministério da Cultura – MINC, a FUNARTE, a VALE, a Caixa Econômica Federal, o Banco do Nordeste, o Tribunal Regional do Trabalho – TRT, a UFMA, o UNICEUMA, o INFET/MA, a Secretaria de Trabalho e Economia Solidária do Estado – SETRES/MA, e o SINDUSCON.
Com os parceiros realizamos muitos Projetos tais como: Artesanato em Cerâmica de Ribamar; Cultura e Arte em Ribamar; Mão que Constroem; Mãos que Educam e Constroem; Arte com as Mãos: Sustentabilidade com Criatividade; Exposição Navegando 400 Anos de Cultura; Prêmio SEBRAE TOP 100 de Artesanato – Edição 2011; Prêmio Economia Criativa - Gestão de Empreendimentos e Negócios Criativos.
O sucesso dos Projetos realizados pela Associação foi tão grande que tornou a Associação uma referência na vida cultural da cidade de Ribamar, sua sede passou a ser Ponto de Visitação Turística, incluído no mapa turístico da cidade, e esse fluxo de turistas possibilitou o aumento das vendas diretas na sala de comercialização da Associação. Os resultados até aqui alcançados fizeram aumentar nossa autoconfiança e também a nossa responsabilidade com o artesanato e com o mercado, pois temos que seguir as tendências, cumprir prazos e garantir a qualidade dos nossos produtos.
Além disso, novos desafios começaram a surgir, como por exemplo: ampliar os canais de comercialização destes produtos, pois como sabemos o tempo não para.
Por isso tenho determinação para seguir em frente e faço questão de socializar com outros artesãos as nossas experiências exitosas com o artesanato. Com muito orgulho digo que faço parte desta Associação lutadora e vencedora, com 13 anos de trabalho, de muita dedicação, aprendizado e crescimento dos artesãos, e que ainda tem muitos caminhos de sucesso a trilhar.